A venda de lotes não aprovados ou construções sem as devidas aprovações, caracterizam loteamentos clandestinos ou ilegais, gerando inúmeros problemas para a cidade como um todo, caracterizando situação de interesse difuso e merecendo um alerta, atenção e providências para impedir essa prática.

Esses parcelamentos do solo (loteamentos e desmembramentos) iniciados na clandestinidade geram inúmeros danos ambientais: perda dos remanescentes de vegetação nativa e da fauna silvestre;  prejudicam as nascentes, os córregos, o solo e as áreas de mananciais (de onde provém a água de abastecimento público);  geram resíduos sólidos da construção civil e lixo comum, necessitando dos serviços de coleta em áreas impróprias e distante; exigem ampliação das redes de fornecimento de água e coleta de esgoto; exigem outros serviços públicos como transporte, segurança, educação, saúde, etc. Muitos dos serviços públicos mencionados, em áreas afastadas e sem prévio planejamento, geram despesas suportadas com dinheiro público, afetando toda a coletividade pois sabemos que os recursos públicos são finitos.

Essa prática ilegal sem as devidas providências, incentivam a proliferação de outros loteamentos clandestinos, criando um ciclo vicioso.

De um lado a Constituição Federal, norma suprema do país, prevê o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e que os municípios cresçam de forma organizada, respeitando o Plano Diretor (instrumento básico de desenvolvimento). A Lei 6766/79 exige licenças prévias, infraestrutura básica (energia elétrica, iluminação pública, água, coleta de esgoto, escoamento de águas pluviais, etc.), prevendo ser crime o parcelamento do solo não aprovado previamente, além de  proibir expressamente parcelamentos em zonas rurais.  Também a Lei 10257/01 (Estatuto da Cidade), exige o Plano Diretor para permitir um crescimento ordenado, enquanto que a Lei 12651/12 (Código Florestal) protege as áreas de preservação permanente – APP (nascentes, margens dos rios, topos de morros, áreas com declividade acentuada, etc.) e o meio rural contra parcelamentos clandestinos. Também a Lei Orgânica, o Plano Diretor e o Código de Obras de cada Município proíbem parcelamentos e construções sem prévias aprovações e em áreas previamente definidas e com estudos anteriores.

No caso de Jundiaí chegou a existir mais de 300 parcelamentos clandestinos do solo. Na atualidade muitos foram regularizados e outros ainda pendentes de regularização, porque a legislação reconheceu que havia situações irreversíveis. Não obstante, o preço é alto para toda a sociedade, com prejuízos incalculáveis ao meio ambiente artificial e natural, prejudicando o crescimento urbano de forma planejada e custando muito caro aos cofres públicos. Os parcelamentos clandestinos passíveis de regularização ocorreram, na maioria, há mais de 20 anos, encontrando respaldo do legislador federal e municipal que editaram normas de regularização.

Essa não é a situação ideal, sendo vergonhoso avaliar que quem descumpriu a legislação acabou beneficiado com a regularização, não obstante seja obrigação de quem vendeu e de quem construiu irregularmente providenciar a infraestrutura básica (água, esgoto, solução de escoamento de águas pluviais, luz, energia elétrica, asfalto, etc.). Aliás, é muito comum que com a possibilidade de regularização e início de pagamento do IPTU (que é imposto municipal sobre a propriedade urbana) os moradores desses loteamentos que nasceram na clandestinidade e ilegalidade passem exigir aquela infraestrutura básica, incluindo asfalto, o que acaba onerando ainda mais os cofres públicos (lembre-se: dinheiro de toda a comunidade que contribui com impostos e necessita de diversos serviços públicos como educação, saúde, segurança, habitações regulares e para a população de baixa renda, etc.).

Para conter inúmeros parcelamentos clandestinos do solo, nos últimos 20 anos foram adotadas diversas providências, valendo mencionar a proibição da lavratura de escrituras públicas e seu registro envolvendo a venda de frações ideais (parte de área maior sem a devida aprovação do parcelamento). O artigo 65, caput, da Lei nº. 4.504/64, prevê que “o imóvel rural não é divisível em áreas de dimensão inferior à constitutiva do módulo de propriedade rural.”, impedindo com isso seu desmembramento, com a nítida intenção de evitar-se proliferação de parcelamentos clandestinos na zona rural (onde os municípios não estão preparados para atender com os diversos serviços públicos que a população em geral necessita).

Também ações civis públicas foram propostas pelo Ministério Público junto à Justiça, contra loteadores, contra quem construiu sem licenças, bem como contra órgãos públicos que se omitiram na fiscalização, para  obter ordem de desfazimento dos loteamentos clandestinos. Algumas ações visaram impedir que a CPFL e o DAE fizessem ligações de energia elétrica, água e esgoto, pois sem tais serviços públicos os parcelamentos irregulares não tem como se desenvolver. Ao contrário, com tais serviços públicos, a fixação das famílias nas construções irregulares tornam a situação  irreversível.

O Ministério Público também instaurou diversos inquéritos civis para obter junto ao Município uma melhoria da fiscalização, evitando-se novos parcelamentos do solo e o ciclo vicioso de ilegalidades e regularizações. Os cofres públicos não podem ser onerados com despesas elevadas para regularização de loteamentos que nasceram ilegais, em prejuízo de toda a coletividade, além do que com prejuízos irreversíveis ao planejamento de todo o Município, incluindo danos ambientais irreversíveis.

A legislação sobre parcelamento do solo deve ser cumprida, evitando que a maioria da população arque com os prejuízos causados por quem vende e quem constrói ilegalmente.

Não se está falando, no mais das vezes, em população carente (parcelamentos de interesse social, núcleos de baixa renda), mas na maioria das vezes de parcelamentos de classe média, constituídos inúmeras vezes por chácaras, com lotes de tamanho significativo, construções de alvenaria, de dimensões razoáveis, muitas vezes envolvendo até mesmo piscinas, pomares e outros elementos que revelam capacidade financeira para aquisição de imóveis em locais regularizados e dentro dos padrões legais. Em áreas rurais e de mananciais essa prática é ainda mais grave.

Mais recentemente a Prefeitura de Jundiaí (após trabalho conjunto realizado com o Ministério Público) tem desenvolvido trabalho para contenção de loteamentos e obras clandestinas, incluindo embargos, multas e até mesmo demolições e apreensões de materiais de construção, com uma atuação mais ágil e célere, de forma administrativa e sem necessidade de ações judiciais, ou seja, exercendo seu “poder de polícia”. Isso tem contribuído para reduzir essa prática e conter o ímpeto de outros que pretendem envolver-se nessa prática ilegal de lotear e construir ilegalmente.

Por isso, antes da compra de qualquer lote, é preciso verificar a documentação e consultar a Prefeitura e o Cartório de Registro de Imóveis. Fica a dica: só compre e construa se a documentação estiver toda em ordem, evitando prejuízos financeiros significativos. Não basta a escritura pública anterior, mas a matrícula imobiliária, com lotes individualizados (não compre se a área estiver constando na matrícula imobiliária como sendo de tamanho superior ao que está sendo vendido; não aceite contrato de “gaveta” pois o prejuízo pode ser grande; não construa sem licença prévia da Prefeitura, evitando ser responsabilizado também pela ilegalidade).

Em Direito se diz que “quem paga mal, paga duas vezes”, o que se aplica a quem compra e constrói sem autorização, pois pode ficar sem seu dinheiro e ainda por cima ter que demolir sua construção para que a legislação, o meio ambiente urbano e natural sejam respeitados, em benefício de todos que querem cidades melhores para se viver, incluindo com adequado planejamento e respeito aos recursos naturais. A regularização é para situações do passado (mas com diversas despesas a serem suportadas pelos interessados e muita dor de cabeça), razão porque não compensa arriscar em incidir nesse tipo de erro, até porque agora há fiscalização muito mais intensa, rápida e eficiente.

Finalizando com um aspecto prático, você aceitaria pagar mais caro pelo transporte coletivo e que demora mais a chegar no seu destino porque o ônibus tem que percorrer mais distâncias, não previstas anteriormente, para atender bairros distantes e que nasceram na clandestinidade? O mesmo se aplica a aspectos como cobrança pela água e esgoto, aumento de impostos, deficiência em serviços públicos (todos pagam pelo erro de alguns).

Lutar por habitação é direito de todos e o Poder Público deve ajudar as classes menos favorecidas, mas isso não pode servir de pretexto para a ilegalidade, pois os danos serão suportados por todos e pelas gerações futuras.


Fonte: Jundiaí Agora.